Liberais Vermelhos

Somos liberais. E somos vermelhos. Ainda vai discutir?

sexta-feira, janeiro 26, 2007

Palavras e coisas.

The Corporation é um documentário legal. Quem não viu até que poderia ver se não estiver fazendo nada melhor. Tem entrevistas legais com personagens pra todos os gostos. Vai ver, vai.

Isso não é uma resenha do filme. Apenas uma fala de certo entrevistado, Michael Moore (aquele do Tiros em Columbine), me chamou a atenção, e comecei a pensar abobrinhas. Seguem abaixo:

A fala era sobre capitalismo, poder e cinema. Disse o entrevistado algo assim: "fazer filme é um modo de tentar mudar as coisas, é nisso que acredito. O capitalismo nos dá a possibilidade de critica-lo, nos possibilita pensar em alternativas porque acredita que ninguém fará nada apenas por ver um filme".

Não sei se a frase era assim. Era por aí. O que em chamou a atenção foi essa "falha" do capitalismo, de que Marx já falava no Manifesto. O capitalismo precisa do livre e sempre crescente volume de trocas e de comércio para se desenvolver. Beleza. Informação é parte desse volume, e quanto mais censuras e restrições houver, menos dinheiro rola solto (ou ninguém acha que o youtube perdeu rios de dinheiro com a censura-Cicarelli?). Beleza.

Faz sentido, mas não acredito nessa frase. Não creio que o capitalismo realmente seja ingênuo a ponto de deixar uma falha tão boba.

Palavras não mudam o mundo se não são acompanhadas de ações. Isso é verdade. As palavras podem incentivar, mas não alteram, por si sós, nenhum mundo, nenhum sistema. Palavras puras são contemplação. A mudança vem a atitude, da atividade, da prática, da práxis.

Ok. Aonde quero chegar? O capitalismo "permite" essa "falha" exatamente porque sabe que palavras vazias são pura contemplação. Porque sabe que a retórica apenas lhe serve. Porque sabe que a única mudança relevante causada por Michael Moore no sistema foi que agora seus bolsos estão alguns milhões mais gordos.

Palavras compram muitas pessoas. Iludem. Seduzem. Enganam. Dão a agradável sensação de que estamos fazendo algo. Mas pára por aí. Não mudam nada. Não salvam o mundo. Essa retórica da indústria, pretensa falha do capitalismo, é mais um de seus mecanismos para se fortalecer.

Nunca, nunca mesmo, houve uma ação que fosse "permitida" pelo capitalismo. São sempre tachadas, esvaziadas de sentido e confundidas com bandidagem e terrorismo comuns. As palavras são permitidas, a ação não. As palavras circulam livremente por rádios, tvs e internet. As ações, greves, manifestações, são sempre vigiadas de perto pela polícia, pelo exército. Estão sempre sob mira de armas.

Palavras enriquecem cineastas bonachões. Palavras iludem pessoas carentes de ideologia. Palavras não salvam o mundo. Podem ser indispensáveis ao salvamento, mas não são suficientes para cumpri-lo. O mundo dos homens só pode ser salvo pelas mãos dos homens. Pelas mãos. Não pelas bocas.

PS: Só para constar, é verdade que sistemas capitalistas são, geralmente, confiantes o bastante para crer que as palavras podem circular, mas as ações sempre serão contidas. Outros sistemas há em que as palavras representam perigo o bastante, como incentivadoras da ação. O método preventivo é a censura. Vide certos pretensos comunistas.